Semana Consciência Negra Colégio Viver 2021

Semana Consciência Negra Colégio Viver 2021

Reconhecemos a necessidade de aprofundarmos cada vez mais a discussão e a construção de uma escola antirracista que apoie o desenvolvimento de uma experiência positiva e de empoderamento das pessoas negras que integram a nossa comunidade de aprendizagem, assim como a necessidade de um letramento racial para toda a nossa comunidade.

Uma parte importante desse processo precisa ser desenvolvido através de espaço para escuta da voz e das vivências das pessoas negras. Portanto, entendemos que a escola precisa estar aberta a aprender com os movimentos sociais, com coletivos e pessoas envolvidas na luta antirracista. É preciso também partir do reconhecimento do racismo estrutural que compõe nossa sociedade, que produz efeitos diretos na forma como as instituições se organizam e  como as relações interpessoais  se dão nos espaços sociais. 

O processo histórico brasileiro foi e é marcado por profunda desigualdade e exploração do povo preto, e a reprodução do racismo e de preconceitos são naturalizados e sustentam a colonialidade como mecanismo que mantém estruturas sociais e de poder intactas. Nesse sentido, por acreditarmos numa educação democrática, que busca o desenvolvimento de uma sociedade mais igualitária, a questão racial é um tema fundamental a ser considerado na escola.

Nesse ano de 2021, aproveitamos o retorno presencial nesse segundo semestre, para ampliarmos as discussões sobre as relações raciais na escola, de uma forma mais diversificada para nossos educandos. Esse tema precisa fazer parte de todo o currículo escolar, ao longo do ano, mas também vemos a necessidade de ressaltar o foco e a atenção em certos momentos para aprofundar um pouco mais o estudo. Foi organizada uma semana em todos os segmentos da escola no mês de novembro, desde a educação infantil até o ensino médio. A equipe de professores organizou diferentes atividades e foram também convidadas, pessoas de fora do Colégio Viver para abordar assuntos que abarcam a temática da Consciência Negra, como a cultura afro-brasileira, mitologia dos orixás, construção histórica do povo brasileiro, identidade negra, oficinas culturais e rodas de conversa sobre o racismo e seus impactos.

Tivemos como convidada, uma mãe da nossa comunidade, Ligia Nicaccio, com a oficina de dança e contação de história: “Mitologia dos Orixás: brincando com os Deuses da Natureza” com as crianças do 1º ao 5º ano. 

“Queria agradecer e dizer que trabalho com dança afro-brasileira há mais de 15 anos, e já trabalhei muito em escola, e eu nunca dei uma oficina de dança, de Orixá, numa escola em que eu fui tão bem recebida pelas crianças. Normalmente, o que acontece é que a gente vai a escolas, às vezes, particulares que se dizem desconstruídas, e as crianças fazem chacota, dão muito mais risada do que participam, acham estranho, ou dizem que é feio, ou do diabo, já ouvi muita coisa. E isso não aconteceu, foi muito pelo contrário, ver as crianças dançando, cantando e interessadas, foi maravilhoso. A hora que eu sentei na roda de 1º e 2º e eu falei que a gente falaria de Orixá, e 90% das crianças dizendo “eu sei”, me arrepiei da cabeça aos pés, e acabou meu medo de estar na escola. Ficou muito claro na aula, que não é um assunto estigmatizado, um tabu, que não é falado por vocês, eles conheciam, sabiam do que eu estava falando, e conheciam orixás que não são famosos na mídia, valorizavam a cultura. Me senti muito respeitada, muito bem recebida, e senti essa valorização por parte das crianças, vamos fazer mais vivências assim!”

Ligia Nicaccio, com a oficina de dança e contação de história: “Mitologia dos Orixás: brincando com os Deuses da Natureza”

Uma outra mãe que faz parte da comunidade viveriana, que ofereceu uma dinâmica com as crianças da educação fundamental 1 foi a Elisama Santos escritora, psicanalista e palestrante com o tema: “Coisa de Preto”, trazendo problematizações sobre os lugares sociais impostos pela dinâmica racial desigual naturalizada em nossa sociedade.

Elisama Santos escritora, psicanalista, palestrante e mãe no Viver com o tema: “Coisa de Preto”

Para o quinto ano, e para os adolescentes do ensino fundamental 2, tivemos como convidado o educador Dimi, que trouxe debates sobre “A desconstrução do Racismo contemporâneo”

“É muito bom saber que o Colégio Viver promove uma discussão que dá luz a um problema que fere as pessoas pretas, dando aos estudantes ferramentas para serem agentes ativos de uma sociedade que busca equidade e justiça social.” (Dimi).

No ensino fundamental 2 e ensino médio também tivemos a presença do convidado Boa Alma, capoeirista e historiador, que trouxe o tema : “A travessia do Atlântico. Recriando-se uma nova África em terras brasileiras.”.

“Das muitas experiências boas que tive na minha vida profissional de pesquisador, palestrante e aspirante a historiador, uma delas foi está presente na semana da consciência negra no Colégio Viver. Aprendi muito com as crianças, adolescentes, professores(as), e todas as lideranças da instituição. Parabéns a todos pelo profissionalismo e obrigado pela recepção.”

(Boa Alma).

Outra convidada que conduziu uma roda de conversa com os educandos maiores, foi a Simony, cientista social que trouxer a discussão sobre “O racismo é um problema de todos”.

“Para mim, a importância do Colégio Viver debater uma semana da consciência negra, é reconhecer o seu lugar de privilégio neste debate. As alunas, alunos e alunes são têm acesso a uma educação que a grande maioria das pessoas negras não tem. Desse modo, o colégio contribui com o combate ao racismo, ao ajudar estudantes a se localizarem na luta antirracista.”

(Simony dos Anjos)

Além dessas vivências, a equipe de educadores do Viver também desenvolveu oficinas e rodas de conversa sobre essa temática, buscando sensibilizar os educandos para esse assunto. 

O educador Curió, professor de capoeira e de Cultura Popular aqui do colégio, ofereceu para o f1 a oficina de samba e roda de maculelê e para o f2 e ensino médio a oficina: “Besouro Mangá e memórias do Recôncavo Baiano- maculelê no f2 e EM “. Seu relato: 

“Participar da construção dessa semana no Colégio Viver, pra mim, é a possibilidade de trazer uma reflexão para educadores e estudantes que já está presente no cotidiano de pessoas pretas mas que nem sempre recebeu o devido valor nos currículos escolares. É compartilhar a certeza de que os conhecimentos de nossos ancestrais, são tão importantes ou mais do que aqueles trazidos pelos colonizadores! É também a oportunidade de aprender sempre mais com os colegas que se dispõem a dividir seus saberes num ato de militância e esperança de um mundo mais justo, trazendo a cultura da Capoeira, do Maculelê, dos contos africanos, dos orixás e a luta antirracista.

(Mestre Curió)“


Tivemos alguns depoimentos interessantes das crianças do f1 sobre a experiência:

M. aluna do 4º ano: “Eu gostei muito da Consciência Negra, eu até queria que continuasse, todo dia, todo ano, toda hora e sempre, porque sempre  a gente precisa respeitar as pessoas negras, e não importa como, aprendi várias coisas novas.  Eu já conheço bastante porque minha mãe tem um livro dos Orixás que ela lê à noite e eu ouço, e eu amei as danças, foi o que eu mais gostei. “

G. aluno negro do 5º ano: “Foi importante porque as pessoas refletiram que a consicência negra não é só para tratar os negros como gente, mas tem que ajudar, tem que melhorar, tem que acabar o racismo, tem que tirar essa mentalidade dessas pessoas que negro é diferente só por causa da cor de pele. Eu gostei de muita coisa, gostei da aula do Curió que mostrou que até ele é negro de pele clara. Tem pessoas brancas que ajudam e respeitam os negros, mas tem pessoas brancas que odeiam muito os negros, só por causa da cor de pele. Gostei de tudo que teve na semana, tudo estava incrível!”

R. aluno negro do 4º ano: “ Eu não conhecia muito, e depois que tivemos a semana da consciência negra, aprendi mais sobre as pessoas negras.”

G. aluno do 2º ano: “ Eu gostei da dança, e gostei de assistir o vídeo da Mc Sofia, não conhecia ela, aprendi que não pode ser racista”.

J. aluna negra do 5º ano: “Eu gostei bastante, eu não sabia que a princesa Isabel tinha feito a abolição para continuar com as terras dela. Eu adorei a oficina do Curió, e eu gostei da oficina que a gente fez como se fosse um teatro sobre o período da escravidão.”

E. aluna do 2º ano: “Gostei bastante de aprender sobre os Orixás, sobre nossa história, sobre os lugares que essas histórias passaram. “

M. aluno do 5º ano: “ Eu entendo a semana da consciência negra, mas por um lado é triste, porque só respeitam os negros nesses momentos, depois já acontecem as coisas que acontecem no mundo todos os dias. Acho que é muito útil porque faz a gente refletir sobre, e cada vez, a gente vai fazendo menos. Eu gostei muito da oficina em que a gente virou ator, eu fiquei triste porque descobri que nesses barcos dos navios negreiros, morriam muitas pessoas e eram jogadas no mar, o que fez mudar até as rotas dos tubarões, essa oficina do teatro foi uma das que eu mais gostei. Eu acho que as pessoas tem que se esforçar para acabar com isso, e as pessoas terem os mesmo direitos.”

L aluno negro do 2º ano: “Eu gostei muito da semana da Consciência Negra porque foi para os negros, e para o antibullyng e antirracismo, foi bem legal. É bem chato que os negros já foram escravizados e hoje ninguém tem respeito aos negros, então por isso que eu gostei. Foi a primeira vez que eu ouvi falar sobre essas coisas, e acho que precisa ter mais, porque é bem legal fazer isso pro antirracismo. “

A, aluna do 5º ano: “Eu acho que foi muito importante, já vi alguns amigos negros sofrendo racismo desde muito pequena, mas a gente não sabia que era isso, e quando a gente cresce a gente vê o quanto isso é ruim para a pessoa, o quanto ela se sente mal, e ela só tem a cor de pele diferente. As pessoas que fazem racismo fazem para se sentir melhor do que as outras pessoas, só por ser branca, um motivo nada a ver, porque isso não muda nada. Na minha escola antiga, tinha uma visão bem diferente, desde pequena lá eu falava lápis cor de pele, e depois aqui na escola, que a gente foi falando mais sobre isso, eu percebo que eu falava esse tipo de coisa na frente da minha melhor amiga que é negra e ela devia se sentir mal com isso. Agora que eu mudei para o Viver, eu acho muito legal essas aulas porque a gente pode conversar sobre isso, e acho bem importante, ainda mais para as crianças não crescerem como as outras, e terem preconceitos. Acho importante as crianças conversarem sobre isso para não crescerem sendo preconceituosas.”

M. aluno negro de 3º ano: “Adorei muito, as atividades foram muito legais, eu já conhecia sobre isso, mas só sei que eu gostei bastante.”

R. aluna do 2º ano: Gostei muito da aula de Curió, da história que ele contou e da música que a gente tocou.”

M. aluna do 5 ano: “Eu gostei bastante porque foi uma semana que teve muitas pessoas que vieram falar com a gente, foi importante a aula da Jônia, porque antes eu falava cor de pele, e agora eu falo o nome da cor, bege, marrom… Foi importante para as pessoas refletirem o que é a consciência negra, que a anos atrás tinham pessoas negras sendo escravizadas, e as pessoas precisam refletir. “

R, aluna negra do 4º ano: “O que eu mais gostei foi a parte da dança dos Orixás que a mãe do Benedito veio ensinar, eu já tinha ouvido falar sobre essa cultura, mas não conhecia as danças.”

P. aluna do 5º ano: “ Eu gostei muito da semana da consciência negra, achei bem interessante, gostei das conversas, das oficinas, eu tive bastante opnião para participar, pude interagir bem, eu não sabia sobre a data da consciência negra e agora eu sei sobre a importância, eu gostei de tudo, queria que isso acontecesse todo ano. Eu achei bem legal a ideia dos cartazes, com textos, com fotos de pessoas importantes, e tem que ter mais no pátio, vi os cartazes, fiquei curiosa para conhecer mais, e também com vontade de fazer cartazes sobre isso pela escola.”

S. aluna do 1º ano: “Eu gostei muito de dançar, tocar e cantar junto com a mãe do Benedito e da aula do Curió”.

G, aluno do 5º ano: Eu achei bem legal, importante poder ouvir as coisas que eles tem pra falar, aprendi coisas que eu não sabia sobre a história dos negros, que eu nunca tinha parado pra ouvir e não sabia, e aqui foi a primeira vez que eu aprendi e ouvi essas coisas. TInham várias coisas que eram tristes sobre essas histórias, mas foi contada de um jeito legal de ouvir a história, foi legal de ouvir e aprender essas coisas que eu nunca tinha visto sobre a escravidão.”

L aluna do 2º ano: “Eu gostei, aprendi sobre a escravidão e que os negros também precisam ser livres, gostei de todas as aulas, algumas coisas eu já tinha ouvido falar, sobre as princesas negras eu nunca tinha ouvido falar. “

C. aluno do 5º ano: “Eu achei legal, eu achei que foi um tempo para a gente pensar, refletir, porque precisa mudar. Eu gostei da dança do facão do Curió, gostei da saia de palha, gostei de conversar em roda, foi muito bom, bem importante, porque a gente precisa mudar esse mundo que está muito ruim.

Compreendemos que a vivência escolar das crianças negras impacta diretamente na construção de sua identidade e no desenvolvimento de um autoconceito positivo. Como o ambiente escolar é uma espaço de trocas sociais, pode reproduzir dinâmicas desiguais, por isso,  é importante que se reflita e cuide da experiência escolar das crianças negras, que muitas vezes se deparam com um ambiente majoritariamente branco, ou que valoriza e ressalta características, valores e padrões eurocêntricos, em detrimento de todas as potências presentes na cultura, estética e história do povo preto.  

Roda de conversa no Viverzinho

Reconhecemos a necessidade de trazer para o simbólico, imagens, que nos afetam e nos constitui, o negro como belo, como saudável, como diverso, valorizado e reconhecido em sua potência, sua cultura, sua história, força e resistência, dentro da educação, dentro dos processos de aprendizagem e de conhecimento, no sutil e no concreto, rompendo com discursos que promovam estereótipos, trazendo representatividades positivas para nossas crianças, criando e reforçando narrativas de afeto e acolhimento. 

Lucas – Professor de música

Agradecemos a todas as pessoas que se dedicaram a esse trabalho. Conscientes que ainda temos muito o que avançar, seguimos estudando, aprendendo, trocando e trabalhando para que a escola seja uma ambiente acolhedor e de respeito para todos, e que a educação antirracista esteja ativa na prática e no nosso dia-a-dia.

Confira abaixo nosso registro fotográfico.

[F1_5º ano] Lucas_Na batida do coração_Semana da Consciência Negra Viver 2021

[EM] DIMI_Semana da Consciência Negra Viver 2021

[F1_4o e 5o ano] Elisama_Semana da Consciência Negra Viver 2021

[F1_F2] DIMI_Semana da Consciência Negra Viver 2021

[F1] Curió_Mariposa_e_Convidados

[F1_4o e 5o Ano] Marina_O que é ser preto no Brasil

[Infantil] Livro – um mundo de crianças

[Infantil] história- A cor de coraline – Desenho de pessoas que conhecemos com tons de pele diferente da minha, usamos o giz de cera amora

[Infantil] Roda de conversa o que é o dia da Conciência negra – conto afriacano da galinha da angola

Marina Alciati

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